terça-feira, 30 de março de 2010

Paçoca e Marreca, Março de 2010

Algumas imagens do final de semana de 28 e 29 de Março.
Muita chuva, mas também boas baladas subterrâneas.
Um mapa a mais para a região (Marreca) e o início de uma escalada artificial marcaram esta saída.

 Photos by Daniel Menin, Marcos Silverio e Renata Andrade

quarta-feira, 17 de março de 2010

TEPUYS, Março de 2010

Por Daniel Menin

A caminho de volta para São Paulo, mas ainda nas proximidades ao sul de Manaus, eu apreciava pela janela do avião a paisagem da maior floresta tropical do mundo. Enquanto voava a cerca de 12 mil metros sobre um mar de mata inexplorada eu ainda sentia as batatas das minhas pernas latejarem. Em meio ao cansaço e sonolência, imagens dos dias anteriores involuntariamente surgiam na minha frente de tempos em tempos. Cenas que insistiam permear minha memória e dominar meus pensamentos. A longa e penante trilha caminhada, os acampamentos e noites mal dormidas, a heterogênea equipe internacional e principalmente a paisagem inóspita, incomum e deslumbrante do topo do Monte Roraima não saiam da minha cabeça.
A palavra Tepuy é um termo originário indígena. Mais especificamente, uma palavra proveniente das tribos de origem linguística Pemon, predominante na região da amazônia venezuelana.
Literalmente, Tepuy em português significa Serra ou Montanha, mas não se deixe enganar por esta simples tradução literal. Os Tepuys não se tratam de meras montanhas comuns mas sem dúvida são locais únicos e especiais. Gigantescos morros em forma de mesa, testemunhos de um relevo antigo que resistiram à erosão, os Tepuys estão localizados em uma região de savana entre a Amazônia brasileira, a Venezuela e a Guyana. Compreendem grandes maciços de Quartzito que emergem acima das nuvens (de 1000 a 3000m de altitude) apresentando paredões de até  700m verticais e um topo plano com áreas que podem compreender centenas de km quadrados. Dos paredões, as águas de dezenas de cachoeiras despecam e desaparecem diante do vento e da altitude. Em boa parte do dia, os ares batem nos paredões e seguem montanha acima se condensando em nuvens. A vista destas montanhas com suas cachoeiras levadas pelo vento e nuvens adentrando nas imensas fendas e formações rochosas possibilita um cenário no mínimo estonteante. Tamanho deslumbre inspirou Arthur Doyle, escritor britânico, em meados de 1920, a escrever uma das mais importantes séries de aventura já publicadas: O Mundo Perdido.
A altitude do Tepuy proporciona em seu topo um clima típico de média montanha e bastante diferente da savana, localizada a apenas alguns kms abaixo. Os imensos paredões verticais serviram de eficiente fator de isolamento e por milhares de anos separaram a fauna e flora do topo destas montanhas do resto da savana. Estes fatores combinados proporcionaram o surgimento de todo um ecossistema particular em cada Tepuy. Animais e plantas se desenvolveram nestes ambientes separadamente do resto da região apresentando hoje uma rica quantidade de endemismos (espécies únicas).
A região ainda apresenta alta atividade e presença indígena. Lendas de tribos e belas histórias folclóricas complementam a importância dos Tepuyis e de toda a região. Parte da área é protegida pelo Parque Nacional Canaima (Venezuela), parte está em terras brasileiras (Parque Nacional Roraima) e parte nas terras guianenses.  Para os índios, os Tepuys são locais sagrados, os quais, para serem escalados, faz-se necessário uma longa preparação espiritual. Algumas tribos afirmam existir três mundos coexistindo paralelamente: o mundo dos homens (tribos), o mundo da natureza (animais e plantas) e o mundo da montanha (espíritos). A harmonia entre estes mundos depende em boa parte dos homens e de suas atitudes diante dos outros mundos. A montanha, com seus espíritos exerce forte poder sobre os outros mundos e é capaz de enlouquecer aqueles que se aventurarem em suas terras caso este não esteja devidamente purificado espiritualmente. Com estas crenças, alguns alardes nos são dados pelos guias e sherpas nos dias de trilha durante a aproximação da montanha... de que um Tepuy é capaz de gerar sentimentos e comportamentos estranhos nas pessoas além de furiosas alterações no clima. Para evitar estes males devemos utilizar os dias de caminhada que precedem a subida como um período para nossa preparação espiritual e consentimento da própria montanha sobre nossa presença.
E estes dias que precedem a subida não são fáceis. Ao todo, cerca de 22km são percorridos a pé, entre caminhadas a céu aberto e sobre o sol escaldante da savana e uma “escalaminhada” do monte, através de uma inclinada rampa em um paredão lateral de cerca de 600m verticais. Este trajeto, com cerca de 3 dias de caminhada é realizado com mochilas cargueiras nas costas, apesar da ajuda de sherpas que carregam a comida e parte do material de acampamento.
Nossa viagem ao todo durou 6 dias, sendo 1,5 dias no topo e os outros 4,5 dias de aproximação ou descida. Os últimos dias (volta) são bastante penantes onde cada metro é uma conquista.
Apesar de todos os desafios, o objetivo da viagem foi atingido com sucesso. Eu me sentia fisicamente cansado, mas espiritualmente renovado e feliz.
Retornamos com boas referências, com bons contatos e principalmente com aprendizados que vão nos ajudar muito no futuro e nas próximas expedições.
Agradeço ao Instituto do Carste, mais precisamente a Augusto Auler, pela iniciativa, inspiração e organização. Com certeza, esta foi a primeira de muitas viagens aos Tepuys e que em breve nos levarão a documentar as riquezas e partes mais escondidas destas montanhas tão especiais: as cavernas.



Mais fotos em:
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