Aproveitando o embalo
da viagem anterior, voltamos ao abismo Los Três Amigos no primeiro final de
semana de Julho.
A viagem contou com
os espeleólogos Thomaz Rocha e Silva (Vagalume), Bia Hadler, Ivo Paris, Eduardo
e este que vos escreve, Daniel Menin. Como sempre, também nos ajudaram o Zé
Guapiara e seu filho Silas.
Resolvidos todos os
preparativos, conseguimos sair da casa do Zé, de trator, as 7h30 do Sábado,
meia hora antes do previsto.
Após a costumeira
parada na casa de pesquisa para deixar as coisas e fazer os lanches, pegamos a
trilha as 10h30 da manhã e por volta das 11h45 estávamos na caverna já
instalando a corda da entrada.
O objetivo desta
viagem era descer até o rio e caminhar para o extremo Oeste da caverna.
Deveríamos continuar a topografia pelo conduto fóssil deixado em aberto e
também buscar alguma conexão com a caverna João Dias. A plotagem da linha de
trena da caverna indicava que estávamos a poucos metros de distância da João
Dias e uma conexão seria histórica, além de evitar o penoso e longo caminho
pelo abismo. Enquanto eu, Bia, Vagalume e Eduardo entrávamos na gruta, o Ivo e
o Zé ficariam de apoio e prospecção externa.
Descemos até o
salão em cerca de 3 horas. Após um lanche rápido na parte seca, seguimos em
busca da corda que leva até o conduto de rio.
Eu me lembrava que
a corda estava fixada em um grande bloco e descia no meio do desmoronamento até
o rio, cerca de 20m abaixo. Caminhar nesta parte da caverna é difícil e
demorado. Os blocos são enormes e os desníveis exigem várias passagens
escorregadias. Após cerca de 1h procurando, encontramos o ponto de descida.
Feita uma verificação na corda, desci primeiro por uma parede inclinada e
escorregadia. Um desvio evita o desgaste da corda em uma superfície cortante e
leva até o piso do conduto, a uns 3m abaixo. Ali ao lado, a água e um vasto
conduto de rio segue para ambos os lados.
Caminhamos pelo
conduto belíssimo, com represas mais profundas e água corrente transparente. O
conduto na maior parte do tempo é largo. Ora o teto é mais baixo, ora está a
mais de 40m de altura conectando com grandes condutos superiores. Algumas
passagens são mais difíceis, com desmoronamentos a serem vencidos, mas nada que
impeça a passagem.
Em um dado momento
somos obrigados a subir entre os blocos e sair do rio. Após passar um enorme
chuveiro, conseguimos acessar um gigante conduto superior. A sala é enorme e
apresenta grandes desníveis. Uma área mais baixa na lateral, com piso plano,
escorrimentos e formações. Do outro lado, uma parte desmoronada e muito alta,
com blocos grandes. O teto está a mais de 45m e alguns condutos laterais
superiores parecem dar continuidades, mas são inacessíveis. O rio segue por
baixo e a este momento se desenvolve por um conduto independente.
Feita uma
fotografia rápida, resolvemos seguir a exploração verificando o caminho mais
evidente para então topografar na volta.
É preciso tempo,
paciência e cuidado para encontrar os melhores caminhos. Seguimos pelo grande
conduto acessando outras salas. A caverna parecia não ter nem sinal de
terminar.
Em um momento
parece ter uma subida muito íngreme e exposta, mas é possível descer pelos
blocos até chegar a parte mais baixa do salão. De lá escutamos novamente o
barulho do rio e seguimos um caminho acessando o nível inferior. Era um terraço
com cerca de 8m de altura. Embaixo, corria o rio em um conduto amplo e bem
delimitado. Como tínhamos uma corda de aproximadamente 10m, resolvemos descer.
Instalamos ela em uma grande estalactite e rapelamos facilmente até o conduto.
As possibilidades eram claras para os dois lados. Resolvemos seguir a direção
mais promissora, seguindo à montante. Parecia termos chegado à caverna João
Dias ou alguma outra gruta conhecida. Procurávamos constantemente pegadas ou
algum sinal de visita humana, mas não encontramos nada evidente, apenas algumas
pegadas de paca. Seguimos pela água do rio, deixando para trás várias
possibilidades de escalada para grandes condutos superiores.
Resolvemos parar a
exploração em um desmoronamento após testar algumas passagens mais apertadas.
Por baixo, a agua segue entre blocos e é preciso se molhar completamente
espremendo-se entre as pedras. Uma forte corrente de vento entre os blocos indica
boas continuidades. Por cima é possível acessar um conduto amplo através de uma
escalada não muito difícil. Por se tratar de um lance negativo de certa de 3m,
resolvi não arriscar sem o apoio e equipamentos adequados.
Paramos a
exploração naquele ponto e começamos a retornar topografando todo o caminho.
Pelo rio, seguimos
além do rapel por mais uns 150m. Já cansados e sem chances claras de terminar,
deixamos uma base fixa em uma sala desmoronada e voltamos para a corda.
Topografamos a subida para a sala fóssil e boa parte do grande conduto até
conectar com a base da topografia anterior. Foram cerca de 440m topografados e
várias continuidades deixadas em aberto. Acabamos a topografia por volta das
23h do Sábado.
O retorno foi penoso.
Estávamos muito cansados e cientes de que nada poderia dar errado. Uma torção
de pé naquele ponto já seria crítico e causar problemas enormes. Ao chegar no
salão, resolvemos iniciar de imediato a subida visto que o grande lance leva
cerca de 30min por pessoa. Fomos subindo lentamente cada lance de corda. O
combinado era nos encontrarmos na cota de -40m, onde deixamos em uma sala seca
e plana água e alguma comida para antes da saída.
A Bia foi na
frente, eu no meio e o Eduardo por último. A cada lance fui parando e me
certificando que estava tudo bem com todos. Quando eu me aproximava dos -40
escutei conversas da Bia com alguém. O Vagalume tinha decidido não descer para
o grande salão, mas eu não imaginava que ele nos esperaria por toda a jornada até
a madrugada do dia seguinte.
As 3h00 cheguei ao
ponto combinado e encontrei o Vagalume e a Bia batendo papo e esquentando água
para chá e comida no fogareiro. Que alívio estar somente a 40 metros da saída e
em um conduto seco! O Vagalume me emprestou um isolante que utilizei para me
manter aquecido enquanto comia um banquete de comida liofilizada.
As 5h30 estávamos
os quatro fora da caverna. O dia ainda estava escuro e seguimos mata adentro
com o restante de luz que ainda nos sobrava. Durante a trilha o dia foi
amanhecendo. Chegamos na casa de pesquisa já claro momentos antes da
chegada do Ivo e do Zé Guapiara.
Tentei dormir um
pouco, mas o cansaço físico era tanto que não consegui relaxar na cama. Também
sentia frio e depois de cerca de 1h30 resolvi levantar para arrumara as coisas.
A Bia e o Vagalume não descansaram na casa. A Bia varou completamente enquanto
que o Vagalume estava mais descansado pois havia dormido o dia todo no salão
enquanto nos esperava.
As 10h estávamos lavando
os equipamentos no Rio. Chegamos em São Paulo por volta das 20h do Domingo e
estou até agora me recuperando, dia a dia do cansaço extremo da viagem.
Serão necessárias
outras muitas viagens a caverna Los Três Amigos para continuar a desvendar este
enorme quebra-cabeça subterrâneo. Continuidade pelo Rio, condutos superiores,
laterais, desmoronamentos, muita coisa segue inexplorada em ambas as
extremidades da gruta.
Por enquanto a saga
de ter que entrar pelo abismo, descer 200m de corda e seguir por condutos
desmoronados gigantes continua. Quem sabe até quando desvendarmos o segredo de
alguma entrada mais fácil ou conexão com cavernas próximas...
Saída da casa de pesquisa. Todos inteiros e felizes... |
1h15 de trilha, fomos bem rápido desta vez. |
Pegadas de onça, muito comum nas trilhas de Bulha |
Primeiros lances verticais, logo na entrada da caverna |
Descidas até o -40, sala quente. |
Grande salão com o lance "Vôo-livre". Ao fundo é possível ver a luz do Eduardo ainda na corda. |
Início da topografia, no extremo Oeste da caverna. Ao fundo escorrimento do grande chuveiro. |
Momento de chegada na casa de pesquisa. 7h da manhã do Domingo (só o que sobrou de nós...) |
Aguardo os próximos capítulos.
ResponderExcluirParabéns a toda a equipe, trabalho fantástico
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