Uma
das maiores e mais desafiadoras cavernas do PETAR está próxima de ter um
mistério revelado: uma nova entrada.
Há
mais de dez anos o Abismo Los Três Amigos desafia os espeleólogos. Desde sua
descoberta, em 2005, foram dezenas de viagens para equipar os abismos,
topografar e amplos condutos de rio e um gigantesco nível fóssil.
Quem
olha apenas para os números não tem ideia da dimensão da caverna: são 4km
de linha de trena e aproximadamente 2km em projeção horizontal, mas estes dados
não refletem nem de perto a grandiosidade dos condutos e a dificuldade de
explorá-los. Após vencer 140m de cordas enlameadas, os espeleólogos têm
que encontrar caminhos entre gigantescos blocos abatidos em uma sequência de grandes salas tanto à Leste quanto Oeste da descida. 60m abaixo, um conduto freático avança ora em grandes proporções, ora entre desmoronamentos dificultando ainda mais a progressão.
A
cada viagem, uma nova peça do quebra-cabeça foi sendo encontrada. Já tentamos
por vias externas em diferentes cavernas para encontrar novas entradas, sem
sucesso. Por dez anos investimos em escaladas e longos desmoronamentos nas
supostas ressurgência e sumidouro, respectivamente caverna João Dias e
Ribeirãozinho III, igualmente sem sucesso. Em 2016 retomamos os trabalhos via
abismo e desde então a cada viagem metros a mais são somados na topografia.
Esta
última viagem teve um contingente excepcional: 17 espeleólogos se uniram na
casa de pesquisa de Bulha D'água com o intuito de somar esforços dentro e fora
da gruta. Duas equipes internas, uma de fundo e outra de apoio se concentraram
no abismo. A primeira tinha o objetivo de equipar os 30m verticais no extremo
Leste da caverna (jusante) e - caso encontrasse novamente a galeria de rio -
seguir mapeando em direção à Ribeirãozinho III. A segunda equipe tinha como
objetivo realizar trocas de corda entre -40 e -80m de profundidade, as mais
duras e enlameadas cordas da gruta. Outras equipes se dividiram entre
exploração da Fenda do Fábio, localizada logo acima da caverna e prospecção
externa na sequência de dolinas à leste da entrada.
A equipe de fundo da gruta tinha um objetivo
audacioso: entrar cedo na caverna, realizar seu trabalho e retornar no mesmo
dia. Com este desafio, dormimos na casa de pesquisa Sexta-feira e Sábado antes
mesmo dos primeiros raios de sol já estávamos com tudo pronto, tomando café e
esperando que o dia clareasse um pouco para entrarmos na trilha. Chegamos na
caverna cedo e as 9h já estávamos na corda. A progressão dentro da gruta foi
igualmente rápido e as 11h da manhã estávamos no extremo Leste, próximo ao
abismo, nosso objetivo.
Levamos
conosco cerca de 60m de cordas e tínhamos 20m de uma antiga deixada no local na
última investida (relato aqui no blog).
A
equipagem com a furadeira facilitou o trabalho, mas demoramos um pouco para
encontrar a melhor logística na ordem das cordas. A corda antiga (cerca de 10
anos de gruta) foi instalada no início da via, para uma aproximação mais
segura. A corda mais fina, colocamos nos primeiros lances inclinados. Finalmente,
a corda em melhor estado foi instalada com uma ancoragem dupla em parabolt para
uma descida livre de cerca de 20m até a galeria de rio. Às 13h estávamos
iniciando a topografia dos condutos novos de rio, seguindo em direção à parte
inexplorada da gruta.
Topografamos
por um amplo conduto, com teto variando entre 20 e 50 metros de altura e
largura entre 5 e 20 metros. Mas a felicidade não durou muito: após cerca
de 200m chegamos até um novo desmoronamento. Pelo rio a passagem era muito
apertada então subimos por uma lateral de areia até que... surpresa! Encontramos
pegadas!!!
Conforme
avançávamos pelo desmoronamento as marcas ficavam mais evidentes.
Rastejamentos, escaladas, escorregadas, a caverna estava repleta de marcas de
exploração antiga e tentativas de atravessar o quebra-corpo. Era evidente que
alguém tentara passar pelo mesmo desmoronamento que nos deparávamos.
Nosso
entusiasmo foi enorme, embora não tenhamos encontrado vestígios de onde vinham
as marcas. A elevação das águas teria apagado as pegadas mais baixas por todo
conduto de rio deixando marcado apenas os locais mais altos. Nossa primeira teoria
é que o explorador teria vindo de cima, por corda e tentava atravessar os
blocos no mesmo sentido de que nós. Ao explorar o rio na montante, também teria se
deparado com uma parte intransponível sem ideia de que havia um grande conduto
fóssil acima de onde descemos de corda, mas claro, tudo isso era suposição...
Outra sugestão é que a pessoa teria vindo da caverna Ribeirãozinho III forçando
muito a passagem entre bolos pela água e depois tentara retornar por cima em
outros caminhos.
Após
várias tentativas por entre os blocos, chegamos em áreas sem marcas e bastante
apertadas. Resolvemos dar por encerrada a atividade e começar a voltar. Durante
o retorno ainda tentamos uma escalada entre escorrimentos, mas sem equipamento
adequado e tempo achamos mais sensato não arriscar.
Saímos
da caverna às 23h chegando na casa de pesquisa por volta de 1h30 do Domingo.
A
segunda equipe concluiu com êxito a tarefa das trocas de corda deixando mais
segura a descida até a cota de -80m.
As
equipes de superfície, composta por integrantes do Bambuí e Grupo Mandurí também concluíram suas atividades excluindo as
possibilidades de conexão via Fenda do Fábio e não encontrando nenhuma nova
entrada pela mata.
A
plotagem da caverna pelo mapa de superfície mostra que a caverna Los 3 Amigos
está a menos de 200m da caverna Ribeirãozinho III, mas uma possibilidade de
conexão via conduto de rio é bastante remota visto a dificuldade entre os
blocos desmoronados em ambas as grutas. Resta como um mistério a entrada que
originou as pegadas encontradas no final da caverna Los 3 Amigos. Certamente
conectamos o abismo com alguma caverna parcialmente explorada, nos resta
entretanto saber qual é esta caverna e onde está sua sua entrada.
Equipe de fundo: conduto de rio descoberto após rappel do abismo na continuidade da caverna (foto Alexandre Lobo). |
Equipe de fundo: escalada de lateral no conduto de rio mapeado no extremo Leste da caverna (foto Alexandre Lobo). Teriam as pegadas vindas daqueles condutos superiores? |
Nosso estado nos raros momentos de descanso |
Equipe de fundo: Self após 15 horas de gruta. Uma sucessão de alívios até chegar na casa de pesquisa. |
Área mapeada na viagem pela equipe de fundo, após descida vertical e reencontro do conduto de rio. |
Equipe de manutenção de reequipagem |
Terraço do vôo-livre durante trabalho de reequipagem. |
Terraço do vôo-livre durante trabalho de reequipagem (abaixo são 53m verticais em um enorme salão) |
Equipe de prospecção Fenda do Fábio |
Exploração de possíveis entradas durante prospecção da Fenda do Fabio. |
Equipe de prospecção realizando descida de entrada vertical (foto: Herman) |
Partes da Fenda do Fábio - Embora esteja a poucos metros de salas superiores da caverna, infelizmente não foi encontrada uma conexão com o abismo (foto: Herman) |
Exploração de possíveis entradas durante prospecção. |
Exploração de possíveis entradas durante prospecção. |
Exploração de possíveis entradas durante prospecção. |
Região da Caverna Los 3 Amigos e Ribeirãozinho III - apenas 200m separam as duas grutas. |
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