"E impelido pela minha ávida vontade, imaginando poder contemplar a grande abundância de formas várias e estranhas criadas pela artificiosa natureza, enredado pelos sombrios rochedos cheguei à entrada de uma grande caverna, diante da qual permaneci tão estupefato quanto ignorante dessas coisas. Com as costas curvadas em arco, a mão cansada e firme sobre o joelho, procurei, com a mão direita, fazer sombra aos olhos comprimidos, curvando-me cá e lá, para ver se conseguia discernir alguma coisa lá dentro, o que me era impedido pela grande escuridão ali reinante. Assim permanecendo, subitamente brotaram em mim duas coisas: medo e desejo; medo da ameaçadora e escura caverna, desejo de poder contemplar lá dentro algo que me fosse miraculoso"
Como era o clima há algumas dezenas de milhares de anos atrás? Como era a vegetação e a fauna onde esta caverna está localizada?
Costumo dizer que cavernas são como máquinas do tempo. Ao explorar esses ambientes, exploramos também o passado.
As fotografias abaixo foram realizadas durante uma expedição científica às cavernas de Iraquara, Bahia, na Chapada Diamantina. O objetivo da viagem foi a observação e coleta de sedimentos para pesquisas sobre os paleoambientes daquela região. Através de datações radiométricas nos cristais de quartzo contidos nestes sedimentos é possível saber quando essa "areia" foi trazida para dentro da caverna por grandes inundações. Junto com ela, uma série de informações dos paleoambientes também podem ser extraídas.
Datações radiométricas calculam o decaimento radioativo de alguns minerais ao longo dos anos, como o quartzo. Através dela, é possível saber quando esses minerais receberam os últimos raios solares. Existem também as radiações cosmogênicas, elas conseguem identificar em minerais (como o Berilo, por exemplo) a radiação que eles receberam vinda do universo profundo. Sim, porque não é somente o sol que emite radiações, mas as estrelas também.
A pesquisa de sedimentologia realizada na região faz parte de uma parceria entre o Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (IGc-USP), a Universidade do Estado de São Paulo (Unesp) e a Universidade do Vale do São Francisco (UNIVASF).
Fotos: Daniel Menin.
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A Rede Taqueupa compreende a uma sessão de salões superiores na caverna de Santana, no Parque Estadual Turístico do Alto do Ribeira (PETAR). A área foi descoberta em uma expedição chamada "Operação Tatus", em 1975, quando espeleólogos do grupo CEU (Centro Excursionista Universitário) estiveram por 15 dias dentro da caverna em atividades de permanência subterrânea, exploração e topografia.
Desde então, devido à sua beleza e fragilidade com poucos precedentes no mundo, o salão foi fechado para o turismo e recebe apenas visitas esporádicas com objetivos técnicos ou científicos.
A Caverna Santana é uma das principais cavernas do Alto Vale do Ribeira. Gerenciada pela Fundação Florestal do Estado de São Paulo, a região está dividida em 4 parques Estaduais: PETAR, Parque Estadual de Intervales (PEI), Parque Estadual da Caverna do Diabo (PECAD) e Parque Estadual Carlos Botelho (PECB). Um mosaico que junto abriga alguns dos mais importantes patrimônios espeleológicos e geológicos conhecidos no Brasil, além de grande parte da reserva de Mata Atlântica, com sua notória biodiversidade.
Patrimônio Ameaçado
Atualmente o PETAR, que abriga a maior parte das cavernas (incluindo a Caverna Santana), vem passando por um polêmico projeto de concessão para iniciativa privada e requer atenção especial da mídia, do poder público e da sociedade. É necessário um esforço para que se encontre - em conjunto - a solução que melhor atenda à população local incluindo seu desenvolvimento social e econômico e a conservação dos ricos recursos naturais.
A Caverna Santana, bem como muitas outras cavernas da região com seus rios, salões superiores e espeleotemas, ainda compreendem a um patrimônio natural e científico pouco explorado. Inúmeros outros "Salões Taqueupas" podem estar escondidos nesta e em outras cavernas. Nestes casos, não somente a beleza tem seu o valor, mas em muitos elementos subterrâneos (como as estalagmites, terraços e depósitos de sedimentos, por exemplo) estão gravadas parte da nossa história, incluindo dados sobre o clima, a geologia e vida na Terra. Conhecer esse patrimônio é certamente o melhor caminho para valorizá-lo e conservá-lo.
Sobre o vídeo e a pesquisa
O presente vídeo foi produzido em atividade de campo realizada em Novembro de 2021. Um projeto de pesquisa em inventário espeleológico para uso educativo e de comunicação científica, realizado pelo Instituto de Geociências (IGc-USP), vêm documentando parte do patrimônio espeleológico do Alto Vale do Ribeira. A equipe permaneceu 16h na caverna e os objetivos, além da documentação fotográfica, também foram de reequipagem e melhoria na segurança do acesso aos salões.
Esta atividade, bem como os outros campos no contexto de pesquisa, são apoiados pelo Instituto Florestal de São Paulo e pelo Conselho Técnico Espeleológico de São Paulo (COTEC).