"E impelido pela minha ávida vontade, imaginando poder contemplar a grande abundância de formas várias e estranhas criadas pela artificiosa natureza, enredado pelos sombrios rochedos cheguei à entrada de uma grande caverna, diante da qual permaneci tão estupefato quanto ignorante dessas coisas. Com as costas curvadas em arco, a mão cansada e firme sobre o joelho, procurei, com a mão direita, fazer sombra aos olhos comprimidos, curvando-me cá e lá, para ver se conseguia discernir alguma coisa lá dentro, o que me era impedido pela grande escuridão ali reinante. Assim permanecendo, subitamente brotaram em mim duas coisas: medo e desejo; medo da ameaçadora e escura caverna, desejo de poder contemplar lá dentro algo que me fosse miraculoso"

Leonardo Da Vinci
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segunda-feira, 27 de maio de 2019

É lançado o atlas das grandes cavernas do Brasil


O Grupo Bambuí e o CECAV estão lançando este mês uma nova publicação para a espeleologia brasileira: CAVERNAS - ATLAS DO BRASIL SUBTERRÂNEO.


A obra é resultado não somente da atualização da Edição "As Grandes Cavernas do Brasil", de 2001, mas de um largo trabalho de novas pesquisas, coleta de dados e topografias realizadas desde a última coleção, há quase vinte anos. 

Este novo livro também expande a lista das maiores cavernas do país destacando as mais relevantes em outras litologias e uma descrição detalhada das regiões espeleológicas do Brasil. O resultado está organizado em 340 páginas coloridas com fotos, mapas, dados e históricos de cada uma das maiores cavernas do Brasil.

O trabalho também não se restringe somente aos autores ou ao grupo, mas representa a atuação de toda uma comunidade espeleológica brasileira atuante e comprometida na documentação e preservação do seu patrimônio espeleológico. É resultado, portanto, da colaboração de inúmeros espeleólogos de diferentes especialidades, grupos e estados do Brasil.



Lançamento em Belo Horizonte: dia 8 de junho de 2019.
Horário: a partir das 18:00 hs

Local: Auditório da CEMIG
Endereço: Av. Barbacena,1200, térreo, Sto Agostinho


Realização:

segunda-feira, 29 de maio de 2017

Expedição Serra do Ramalho 2017


--> A Gruna da Serra Verde e o povoado de Lagartixa

Texto: Ezio Luiz Rubbioli
Fotos e legendas: Daniel Menin

Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas

- Fica na “Largatixa”.
- Lagartixa. É – La-gar-ti-xa.
- Isso mesmo, na “Largatixa”. Disse que visitou várias cavernas, mas não entrou muito em nenhuma delas. Tinha várias fotos de entradas grandes e, pelo que entendi, é um lugar que nunca estivemos antes.

A Serra do Ramalho é um grande maciço calcário que ocupa boa parte dos municípios sul-baianos de Cocos, Coribe, Feira da Mata, Ramalho e Carinhanha, na margem esquerda do Rio São Francisco. Apesar da extensão territorial e os mais de 25 anos de exploração, é incrível que ainda existam áreas intocadas sob a ótica espeleológica. E a Lagartixa (ou povoado Ponta d`Água como preferem os moradores) parecia ser um destes locais “esquecidos”. Quem deu a dica foi uma jovem que mora em Descoberto (local onde estávamos hospedados) e havia feito um trabalho para a escola sobre as grutas e sítios arqueológicos. E as fotos eram prova disso: entradas grandes com muitas concreções e pinturas rupestres.

E foi assim que no dia 30 de abril, antes de voltar para Descoberto, depois de um dia de explorações, resolvemos averiguar as informações. O Povoado de Ponta d`Água fica na borda oeste da Serra do Ramalho em um maciço ligado ao afloramento principal por uma estreita faixa de calcário. Quase uma montanha separada. A estrada de acesso não é das melhores, mas permite que qualquer tipo de carro trafegue até o pequeno povoado. Seguindo uma estratégia de prospecção (que já é quase uma tradição) procuramos o bar mais bem localizado. No caso da Lagartixa, este ficava quase no cruzamento das duas únicas ruas de terra que formam o simpático aglomerado de casas que se alinham diante de imponentes paredões de calcário. Conversa vai, conversa vem e em menos de 10 minutos já tínhamos várias informações sobre cavernas e uma dúzia de dicas e nomes dos protagonistas que podiam

nos acompanhar. O mais incrível era que a nossa fama de “caçadores” de cavernas já havia nos precedido.

- Ahhh! São vocês que ficam entrando nas gruna lá do Morro Furado.
- E como é aquele sumidô lá de Descoberto??
- Tenho um livro sobre as gruna da região - era a revista O Carste que um dos moradores possuía e guardava com todo orgulho - orgulho nosso também.
Isso facilitava muito a conversa e evitava especulações sobre os nossos objetivos. Mas já era final do dia e não tínhamos tempo a perder.

A primeira gruta visitada não passou de um abrigo sem continuações. Algumas pinturas, espeleotemas corroídos, mas nada que justificasse a viagem. Já estávamos a caminho da segunda opção (agora guiados pelo morador Edmilson) que nos orientava por uma estrada esburacada e que mais parecia um caminho de boi. Estávamos prestes a desistir quando encontramos um senhor que vinha a pé no sentido contrário. Questionamos sobre a distância que ainda faltava. Não era muito para ir caminhando se não fosse tão tarde.
- Por que vocês não procuram o Beto ou o Marcelo? Eles andaram um dia inteiro dentro de uma gruna lá na terra deles.
- É mesmo? E o carro chega mais perto.

Meia volta e lá vamos nós atrás do Beto.
A poucos quilômetros dali, encontramos um jovem falador que logo se interessou pela nossa curiosidade: Josemar Silva Santos ou simplesmente Beto. Falou que havia entrado com mais dois companheiros em duas oportunidades na caverna. Na primeira entraram com tochas e quase morreram intoxicados. Na segunda vez foram mais preparados e andaram “umas quatro horas sem ver o fim da gruna”.
- Opa. É o que estamos procurando.
Mas já era tarde. O sol já estava perto do horizonte e o jeito foi combinar um retorno para o dia seguinte.

Chegamos cedo, pegamos o Edmilson e fomos na direção da casa do Beto. No caminho o grupo ainda foi engrossado por mais um morador que também queria conhecer a tal gruta. E quando finalmente chegamos na sua entrada, já éramos uma equipe com 10 pessoas; 6 espeleólogos e 4 guias sem lanterna, sem capacete e com muita disposição. Logo nos primeiros metros o teto baixava bruscamente e o Beto disse que as últimas chuvas haviam carregado muita terra.

- Acho que não dá para passar mais...Um dos guias desistiu de entrar na caverna.
Entramos rastejando na galeria baixa, quase entupida por galhos secos, folhas, terra, mas um vento forte não deixava dúvidas de que estávamos diante de uma gruta que continuava. Logo na frete a galeria tomou dimensões confortáveis com 10 metros de largura e mais de 5 de altura. O Beto ia descrevendo o que encontraríamos mostrando a veracidade das suas explorações pioneiras.
- Lá bem na frente vai ter um estreitamento, mas depois abre e não vimos o fim.

Andamos rápido cerca de 500 metros deixando várias passagens laterais para trás. As marcas no piso não deixavam dúvidas de que aquele sumidouro temporário (totalmente seco até ali) deveria ser periodicamente invadido por um volume considerável de água. Nos locais mais altos ainda era possível encontrar as marcas das pegadas do Beto e seus companheiros. Incrível como eles entraram tanto sem praticamente nenhum equipamento.

Mas era hora de começar a topografar. Dividimos o grupo em duas equipes: a primeira começaria o mapeamento na direção da entrada, e a segunda, voltaria até a boca e entraria topografando. 

Olhando sob uma ótica mais detalhada, a cavidade consiste basicamente de uma galeria principal e várias passagens paralelas menores. Ora a drenagem coincide com o conduto principal, ora busca caminho nas laterais, alargando fraturas mal dimensionadas para o fluxo. Quando abandonado pela drenagem o conduto principal acumula grandes quantidades de sedimentos que chegam a “entupir” as passagens até o teto.

Depois de algumas horas de topografia, as equipes finalmente se encontraram unindo as bases que vinham de direções opostas. Formando uma única equipe numerosa, era hora de partir para o desconhecido. Logo na frente uma bifurcação deixava dúvidas de onde seguir. A galeria da direita seguia para norte, a direção preferencial até ali. Por outro lado, o conduto da esquerda era bem maior. Escolhemos a primeira opção, mas logo nos primeiros metros o ar abafado e a atmosfera pesada indicavam que as chances de continuações estavam reduzidas. O teto abaixava de forma suave e depois de poucos metros deparamos com um lago raso e coberto de jangadas.

O teto abaixava ainda mais e para continuar era inevitável entrar na água. Voltamos à galeria tida como principal que agora segue voltada para oeste e sem muitas passagens laterais. Pouco mais de 150 metros e chegamos a uma passagem bem menor com cerca de 1,5 metros de altura e largura. As pegadas do Beto estavam por todo lado, e ele atestou que estávamos no tal “estreitamento”.

- Mas a gruta depois continua e volta a ficar grande, falou ele categoricamente.
Era um bom lugar para dar meia volta. Grande suficiente para animar um retorno, mas nem tanto para nos arrependermos depois. Saímos da gruta já de noite com 2 km de topografia acumulados nas planilhas de anotação, 6 espeleólogos contentes e já planejando as próximas expedições. Era o nosso últimos dia na Serra do Ramalho. A gruta recebeu o nome da fazenda: Serra Verde.

Já de volta à civilização, debrucei no computador sondando nas imagens do Google o potencial da região. Embora não seja tão extensa como o maciço principal, este afloramento se desenvolve bastante para norte, onde são bem visíveis grandes vales. E que venha a Expedição Lagartixa.

Pegando as dicas com amigos locais
Na Serra do Ramalho, as exuberante Barrigudas estão por todos os lados.




A primeira dica no povoado de Lagartixa não nos levou a uma caverna de fato, mas foram encontradas lindas pinturas rupestres no alto de um abrigo, provavelmente uma caverna obstruída por sedimentos.

Equipe no dia da primeira investida no povoado de Lagartixa,
minutos antes de entrar na caverna Serra Verde.

Alguns caminhos são sobre lajes e lapiás

Topografia na caverna Serra Verde
(mapeados 2km em 2 equipes e um só dia de trabalho)
Galeria ampla e bem ornamentada

No final de uma ramificação da caverna, um lago e muito sedimento.

No fundo da caverna, um animal desconhecido indica que pesquisadores devem retornar em breve.

Mais barrigudas

Última moda na Serra do Ramalho: Crocs e sombrinha para as trilhas.

Na montante de uma drenagem identificada por imagem de satélite:
esta foi a informação advinda de um minucioso trabalho de prospecção a distância que nos possibilitou descobrir a caverna do Otaviano.
Logo após a entrada, uma clarabóia ilumina uma larga galeria na Gruta do Otaviano

Sem pegadas, sem informações oficiais ou mesmo de locais,
tudo indica que esta caverna era até então desconhecida.
Condutos amplos e bem ornamentados
Adentrar em uma nova caverna, onde a cada metro uma surpresa nos aguarda é uma sensação difícil de descrever.



Na Caverna do Otaviano foram mapeados 1,5km de topografia em  2 dias de trabalho 

Parada para lanche e descanso

Uma ramificação leva a um conduto freático com mais de 600m extensão








O apoio e hospitalidade dos amigos locais faz toda a diferença na viagem, da hospedagem às dicas de novas cavernas.

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quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Escalada na Gruta da Marreca desvenda mistério de 50 anos

No final de semana dos dias 25 e 26 de Outubro de 2015 uma equipe de 4 espeleólogos esteve na Caverna Marreca após 6 anos de sua última topografia. O objetivo da viagem era finalmente escalar uma parede no salão final da caverna para desvendar um mistério que persistia há décadas nos mapas anteriores.

Participaram desta atividade os espeleólogos Daniel Menin e Roberto Brandi (GBPE - Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas), Lucas Pagodin (Rejeito) e Beatriz Hadler (Blow) (GEGEO - Grupo de Espeleologia da Geologia - IGc Usp);


Histórico das explorações na caverna

Acessada por uma dolina vertical colapsada, a Caverna Marreca se estende por uma sucessão de amplos salões. A parte inicial da caverna tinha visitas recorrentes na década de 60, quando a região do Lajeado era mais povoada. No lugar de cordas, as pessoas utilizavam escadas de madeira e troncos de árvores para descer o abismo da entrada e acessar a gruta.

Mas a parte visitada se se restringia às áreas mais horizontais. No final da caverna, uma descida acessada somente com a ajuda de cordas leva a uma grande sala a um nível inferior e com um teto a 53m de altura. O salão é obstruído por uma parede de escorrimento de calcita, mas que parece não fechar completamente possibilitando uma passagem na parte mais alta da parede.

A caverna foi mapeada pelo Espeleo Grupo de Londrina e também pelo CAP, ambos os mapas produzidos em 1966. Nestas duas topografias, os mapas não se atreveram a escalada a parede, deixando um ponto de interrogação na suposta continuação superior.

Em 2009, uma equipe do Grupo Bambuí, dando continuidade aos trabalhos de prospecção e mapeamento de cavernas do Lajeado, esteve na caverna para retopografar detalhadamente a gruta. Também nesta ocasião a escalada não foi realizada mantendo a interrogação na passagem superior.

Foi somente na ocasião descrita abaixo que a escalada em fim foi realizada. Utilizando técnicas mistas entre escalada natural e artificial, com uso de equipamentos móveis e fixos uma equipe venceu e e topografou os 53m de desnível da parede. Abaixo o relato da atividades realizada.


Mapas históricos da década de 60

Mapa produzido em 2009, mas que ainda não havia solucionado a dúvida de continuação superior.

Relato da escalada:

DIA 1: da base até o patamar "Rei Artur"

O trabalho de escalada foi iniciado no Domingo, dia 25/10. Eu (Daniel) e Brandi subimos abrindo uma via pela parte direita da parede. Os primeiros metros puderam ser vencidos por uma rampa inclinada, utilizando como apoio rochas e formações na parede. O primeiro ponto de fixação foi a um patamar a cerca de dez metros de desnível e protegido por um grande bloco. Um parabolt foi fixado atrás do bloco e a corda fixada pelo Brandi para a subida dos demais. A escalada até este ponto não havia apresentado nenhuma grande dificuldade e não fosse por medida de segurança, nem cordas seriam extremamente necessárias. Pudemos inclusive observar o rastro de alguém que havia realizado esta mesma subida antes de nós. Não eram marcas muito fortes, mas sugeriria que uma pessoa havia tentado sozinha esta mesma escalada.

Continuando a subida a partir deste patamar o piso argiloso foi ficando mais inclinado e escorregadio. Utilizando pequenos apoios, em um processo de lento rastejamento, o Brandi chegou até uma saliência no teto onde foi possível fixar 2 parabolts. Com esta segurança, foi possível investir mais ao meio da rampa, contornando a parede pela esquerda até uma parte com menos argila e mais calcita exposta, bom para a fixação das ancoragens. Um caminho menos escorregadio, porém mais exposto ao abismo que se abria parede abaixo. 

Os rastros desapareciam neste ponto, o que sugeria que o escalador anterior havia chegado somente a poucos metros acima do primeiro patamar. De fato, eu me lembro de ter tentado realizar esta subida em 2009 até um ponto onde era necessário o uso de cordas, abando a continuidade e desistindo de subir por conta da segurança. Entretanto, não posso afirmar que os rastros eram meus...

O uso da furadeira e parabolts possibilitou um trabalho de escalada muito mais rápido e seguro do que a técnica anterior de martelo e batedor para inserção de spits na rocha. Entretanto, a escalada não foi assim tão fácil. Os parabolts eram fixados no piso ou parede, muitas vezes formados apenas por uma casca de calcita com poucos centímetros de diâmetro, depositada sobre camadas de argila e outros sedimentos. Os parabolts, muitas vezes não expandiam completamente e tínhamos que confiar na segurança pela tração transversal ao furo! 

E nessas condições a escalada prosseguiu até o segundo patamar, a cerca de 12m acima. Consistia em um plano inclinado, mas amplo, onde seria possível comportar todos integrantes da equipe.

Me juntei ao Brandi para dar segurança a mais uma investida, agora por uma parede totalmente vertical. A "cascata" de calcita oferecia alguns pequenos apoios, mas seria impossível de subir sem o uso de técnicas artificiais (furadeira, escadinha e alguns equipamentos de escalada móvel). Agora, por ser vertical, as costuras eram plantadas muito mais próximas, pouco mais de um metro de distância uma das outras. Quando o Brandi estava em cerca da metade da parede, tivemos que trocar a primeira bateria da furadeira, que já apresentava dificuldades por estar com baixa carga. 

De baixo não era possível ver até onde a parede se mantinha vertical. A impressão era que alguns metros a mais e já chegaríamos a uma inclinação menor, onde seria possível avançar com mais velocidade e segurança. Engano. A cada costura o Brandi iluminava acima para se certificar que seriam necessários mais 1 ou 2 ancoragens, e assim por diante. Quando estava a poucos metros do final da subida a segunda bateria da furadeira acabou. O Brandi também já se apresentava cansado e o horário avançado. Por falta de bateria, uma broca que representaria talvez um último ponto de segurança para se acessar a parte mais horizontal teve que ser abandonada. Era impossível retirá-la sem a energia suficiente na furadeira para rotacionar a broca no sentido contrário. 

Antes de descermos eu resolvi tentar subir até a broca e de lá arriscar um rastejamento patamar acima. O Brandi desceu até mim para fazer a segurança e eu segui parede acima, usando a corda fixada na ancoragem do topo da escalada. Chegando no ponto mais alto percebi que era possível acessar a broca com as mãos. Testei o apoio, me certifiquei que suportaria meu peso e utilizando a broca e alguns outros pequenos pontos fui subindo parede acima. Não era uma escalada difícil, mas a aquela altura, uma queda não seria nada agradável. Movimentos delicados eram realizados evitando olhar as luzes de meus companheiros, que iluminavam o amplo salão a algumas dezenas de metros abaixo. 
Mais um pouco e eu já estava de pé, em um patamar bem horizontal. A direita, uma fenda parecia contornar o escorrimento e continuar horizontalmente. A esquerda uma parede totalmente vertical sugeria continuidade da escalada por mais cerca de 15 ou 20m até o teto da caverna. Lá sim parecia efetivamente estar alguma continuação. Entrei na fenda e acessei um pequeno salão com algumas colunas e um forte cheio de guano fóssil. Dentro do salão consegui fazer 2 pontos naturais de fixação da corda, que possibilitaram com que toda a equipe pudesse subir e se reunir neste patamar. A corda usada na escalada tinha 60m de comprimento e foi o suficiente para chegarmos até este ponto, sendo ainda necessário recolher parte dela da primeira rampa no início da subida.

Já eram mais  de 19hs da noite e estava claro que não concluiríamos a escalada naquele mesmo dia. Além de cansados, não havia mais corda suficiente. No entanto, não poderíamos abandonar a escalada em um ponto tão próximo do fim. Decidimos então deixar a caverna toda equipada e retornar no dia seguinte, descansados e com as baterias da furadeira devidamente carregadas. Nomeamos aquele local de patamar "Rei Artur", devido à broca fixada no chão e sem possibilidades de retirada.

Para sair da caverna a partir daquele ponto, levamos 2hs. Chegamos na pousada as 22hs.


DIA 2: do Patamar "Rei Artur" até o teto da caverna

O dia seguinte amanheceu com uma garoa leve. Embora não tenhamos conseguido levantar tão cedo quanto gostaríamos, chegamos na caverna por volta das 10hs da manhã. 
A descida e a progressão até o ponto de escalada foi rápido. Um pequeno incidente foi minha máquina fotográfica ter se soltado do cinto e caído em uma poça d'água. Completamente molhada, não a levei comigo escalada acima e ficamos se fotografias. Uma pena.

Uma vez na escalada, resolvemos que eu e o Brandi alternaríamos a função. Enquanto eu abriria a via parece acima, o Brandi faria minha segurança. O Lucas e a Bia ficaram incumbidos de subirem a via escalada no dia anterior topografando todo caminho.

Já nos primeiros metros da escalada uma dificuldade: A parede sugeriria uma subida por uma via mais a esquerda, totalmente vertical e mais exposta abismo abaixo. Mesmo antes de iniciar a escalada, tive que contornar o escorrimento usando pequenos apoios para não escorregar. Fixei uma ancoragem móvel para poder dar os primeiro impulsos parede acima. Um piton foi martelado em uma reentrância da calcita. Umas marteladas o fizeram entrar e parecer seguro. Nele fixei um mosquetão e uma fita. Apoiei meu pé na fita e me projetei parede acima. Abaixo cerca de 30m de desnível em um negro vazio. Apoiado pela fita peguei a furadeira e fixei o primeiro parabolt. Sem perder muito tempo, mas me enrolando com o frenesi de equipamentos pindurados na cintura consegui colocar a chapeleta, o mosquetão e passar a corda fazendo minha segurança. Ufa! E assim fui progredindo parede acima. Fixando um parabolt a cada 1,5m de desnível para então ter apoio e subir mais um pouco.

No terceiro ponto de fixação o Brandi me pede um tempo para tentar retirar o  piton fixado para a primeira segurança. Para nossa surpresa bastou ele fazer um movimento leve e o piton saiu facilmente em suas mãos! Brincamos que da li em diante a segurança deveria ser redobrada, pois o anjo da guarda já estava fazendo hora extra!

A parede continuou vertical por mais cerca de 10 metros. Quanto mais eu subia, mais entendia que a capa de calcita não estava tão espessa e os parabolts atravessavam a parte sólida impossibilitando uma segurança plena. Na verdade, serviam mais como ponto de apoio para a escalada do que para fixação confiável para a corda. A determinado momento a parede foi ficando menos inclinada, mas ainda não era possível ver uma continuação superior. Quando estava próximo ao final, cheguei até um pequeno patamar horizontal, na extremidade direita da subida, onde acessei a parede de calcário maciço da caverna. Quando fui fazer uma boa fixação, a bateria da furadeira acabou novamente. Retornei até a última ancoragem, fiz minha segurança e tivemos que fazer todo um exercício de troca de baterias, pois parte do equipamento estava metros abaixo, com o Brandi no patamar do "Rei Artur". A este momento, o Lucas e a Bia já haviam terminado a topografia e faziam companhia ao Brandi, 

Trocada a bateria eu consegui plantar mais 2 parabolts de segurança e então me rastejar para uma área menos inclinada. Em poucos minutos depois e cheguei no final da escalada: Um pequena sala, completamente fechada, conectava a parede de calcita com o teto da caverna. Uma colônia de morcegos me observavam do teto. Dei a notícia de que a escalada havia sido concluída e que a caverna não continuava. Cansado, me sentei alguns minutos para contemplar a paisagem lá de cima. Eu estava no teto da Marreca. De lá, não conseguia ver o solo do salão, mas podia iluminar o outro lado e toda a descida de acesso por onde havíamos chegado. Era uma visão incrível. O grande volume da gruta e a altura daquela escalada me davam uma sensação de aventura extrema. Mesmo que não tivéssemos descoberto uma continuação, havíamos realizado um feito admirável. Uma escalada incrível em uma sala belíssima. Além de resolvido uma duvida que persistia desde a década de 60. Agora era hora de descer e seguir caminho para casa. Realizamos técnicas de recuperação de corda, descendo em corda dupla e tendo que abandonar algumas fitas e mosquetões nos patamares da gruta.

Iniciamos a saída da caverna as 16h00. Paramos alguns minutos para lavar equipamentos em uma pequena barragem ao lado da estrada e próximo ao carro e as 18h30 já estávamos na pousada. Iniciamos o retorno a SP as 19h30.

Para o segundo dia de escalada, conseguimos com o Jurandir mais 40m de corda, o que foi essencial para nos dar cordas suficientes para toda subida. No total, utilizamos, 2 rolos de 40m (um para entrada na caverna, outro ara a descida ao salão final). Para a escalada usamos mais 2 rolos sendo um de 60m (corda nova, do Brandi) e um de 40m (emprestada pelo Jura). Foram plantados mais de 30 parabolts, o que consumiram pouco menos de 4 baterias da furadeira.


O desnível escalado foi de 56m e o mapa da Caverna Marreca pode ser considerado concluído. Restam, entretanto, apenas algumas pequenas passagens próximo ao abismo de entrada para serem - um dia - verificados.

No início: todos limpinhos e contentes.
Abismo de entrada (-18m)



Inscrições deixadas por visitantes locais na década de 60
Descida para grande salão, no final da gruta (-29m)
Descida para grande salão visto da metade da escalada
Ancoragens no teto, pouco acima do primeiro patamar 
Preparação de escalada artificial - escadinha de apoio.
Técnica de escalada artificial, com auxílio de furadeira e parabolts.
Escalada de parede vertical vencida no primeiro dia de escalada 

Iluminando possível continuação, após escalada de uma segunda parede uma dezena de metros acima
(parede que seria escalada no dia seguinte)



Retornando ao grande salão a partir do primeiro patamar
Sistema de segurança de escalada e fixação de corda para subida do restante da equipe
Final dos trabalhos: todos sujos, cansados e felizes



Mapa final, já com área da escalada na topografia.



Agradecimento especial ao Jurandir (Jura) do Parque Aventuras