"E impelido pela minha ávida vontade, imaginando poder contemplar a grande abundância de formas várias e estranhas criadas pela artificiosa natureza, enredado pelos sombrios rochedos cheguei à entrada de uma grande caverna, diante da qual permaneci tão estupefato quanto ignorante dessas coisas. Com as costas curvadas em arco, a mão cansada e firme sobre o joelho, procurei, com a mão direita, fazer sombra aos olhos comprimidos, curvando-me cá e lá, para ver se conseguia discernir alguma coisa lá dentro, o que me era impedido pela grande escuridão ali reinante. Assim permanecendo, subitamente brotaram em mim duas coisas: medo e desejo; medo da ameaçadora e escura caverna, desejo de poder contemplar lá dentro algo que me fosse miraculoso"

Leonardo Da Vinci
Mostrando postagens com marcador Cavernas no PETAR. Mostrar todas as postagens
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quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Rede Taqueupa, Caverna de Santana, SP




A Rede Taqueupa compreende a uma sessão de salões superiores na caverna de Santana, no Parque Estadual Turístico do Alto do Ribeira (PETAR). A área foi descoberta em uma expedição chamada "Operação Tatus", em 1975, quando espeleólogos do grupo CEU (Centro Excursionista Universitário) estiveram por 15 dias dentro da caverna em atividades de permanência subterrânea, exploração e topografia.

Desde então, devido à sua beleza e fragilidade com poucos precedentes no mundo, o salão foi fechado para o turismo e recebe apenas visitas esporádicas com objetivos técnicos ou científicos.

A Caverna Santana é uma das principais cavernas do Alto Vale do Ribeira. Gerenciada pela Fundação Florestal do Estado de São Paulo, a região está dividida em 4 parques Estaduais: PETAR, Parque Estadual de Intervales (PEI), Parque Estadual da Caverna do Diabo (PECAD) e Parque Estadual Carlos Botelho (PECB). Um mosaico que junto abriga alguns dos mais importantes patrimônios espeleológicos e geológicos conhecidos no Brasil, além de grande parte da reserva de Mata Atlântica, com sua notória biodiversidade.

Patrimônio Ameaçado

Atualmente o PETAR, que abriga a maior parte das cavernas (incluindo a Caverna Santana), vem passando por um polêmico projeto de concessão para iniciativa privada e requer atenção especial da mídia, do poder público e da sociedade. É necessário um esforço para que se encontre - em conjunto - a solução que melhor atenda à população local incluindo seu desenvolvimento social e econômico e a conservação dos ricos recursos naturais.

A Caverna Santana, bem como muitas outras cavernas da região com seus rios, salões superiores e espeleotemas, ainda compreendem a um patrimônio natural e científico pouco explorado. Inúmeros outros "Salões Taqueupas" podem estar escondidos nesta e em outras cavernas. Nestes casos, não somente a beleza tem seu o valor, mas em muitos elementos subterrâneos (como as estalagmites, terraços e depósitos de sedimentos, por exemplo) estão gravadas parte da nossa história, incluindo dados sobre o clima, a geologia e vida na Terra. Conhecer esse patrimônio é certamente o melhor caminho para valorizá-lo e conservá-lo.

Sobre o vídeo e a pesquisa

O presente vídeo foi produzido em atividade de campo realizada em Novembro de 2021. Um projeto de pesquisa em inventário espeleológico para uso educativo e de comunicação científica, realizado pelo Instituto de Geociências (IGc-USP), vêm documentando parte do patrimônio espeleológico do Alto Vale do Ribeira. A equipe permaneceu 16h na caverna e os objetivos, além da documentação fotográfica, também foram de reequipagem e melhoria na segurança do acesso aos salões.

Esta atividade, bem como os outros campos no contexto de pesquisa, são apoiados pelo Instituto Florestal de São Paulo e pelo Conselho Técnico Espeleológico de São Paulo (COTEC).





Nota: Por favor, não reproduza imagens deste vídeo ou site sem o consentimento do autor e seus devidos créditos.

Abaixo segue um making off das fotos do vídeo anterior.
Obra do espeleólogo Eduardop Oliveira (Dudu).

 



segunda-feira, 27 de agosto de 2018

Abismo Los Três Amigos revela novas peças de um grande quebra-cabeça


27 de Agosto de 2018. 


Escrevo este relato ainda me recuperando da última incursão ao Abismo Los 3 Amigos.

O objetivo desta viagem era trabalhar no extremo Oeste da caverna, região mais próxima às cavernas João Dias e Ribeirãozinho II. Existiam pendências nas duas direções do conduto de rio encontrado na viagem anterior (montante e jusante). Uma delas voltava em direção a um grande salão fóssil, a sala do chuveirão. A outra consistia em uma escalada no sentido principal do desenvolvimento da caverna, em direção à Ribeirãozinho II. Entre estes dois extremos, alguns condutos superiores de fácil acesso haviam sido deixados para trás na viagem anterior e queríamos desta vez explorar.

Havíamos ainda como incumbência trocar as cordas entre as cotas -40 e -80m da entrada, pois estavam duras e enlameadas. Outra corda a ser trocada era a de descida entre o grande salão do voo livre e o conduto de rio, instalada em 2006 na ocasião da primeira descida.

Por conta destas trocas e de mais equipamentos de topografia, estávamos um pouco mais carregados do que de costume.
Prevíamos que a atividade seria longa. Por isto combinamos com o Zé de nos buscar de trator na trilha as 7h da manhã do domingo.

Sexta-feira dormimos em sua casa, depois de uma noite de muita chuva e fortes trovoadas. A logística de saída no Sábado de manhã foi rápida. Como a estrada de Buenos estava em boas condições, boa parte dela foi feita de trator e as 10h45 já estávamos descendo os primeiros lances de corda.

As trocas de corda na descida ocorreram sem problemas. A maior dificuldade foi abrir os mosquetões que com o tempo dentro da gruta apresentavam rosca muito dura. A boa desenvoltura de todos no vertical ajudou e logo estávamos fazendo um primeiro lanche na base do salão do voo livre. A corda do rio foi trocada sem problemas e um fracionamento instalado onde antes havia apenas um desvio.

As 14h da tarde nos encontrávamos todos reunidos no extremo Oeste da caverna, já separando as equipes de topografia. Uma parte, composta por Thomas (Vagalume), Ives e Adelino, seguiram à jusante do rio por um conduto amplo em direção à sala do chuveirão. A outra, composta por mim (Daniel), Rejeito, Bia e Diego seguimos em direção à montante onde, na viagem anterior, havíamos interrompido a topografia.

Após uma pequena escalada, acessamos um conduto fóssil contornando por cima o desmoronamento de onde o rio ressurgia. Nossa felicidade não durou muito tempo e logo acessamos uma área muito instável, com blocos e lama.
Após uma descida de corda entre blocos nos vimos de novo no desmoronamento. Com passagens estreitas entre blocos tanto na água quanto por cima, forçamos por cerca de duas horas alguma passagem. Uma leve corrente de ar, insetos e sedimentos (galhos) indicava que poderíamos estar perto de alguma saída, mas tivemos que desistir após muitas tentativas frustradas.
No retorno fizemos a topografia por um caminho superior conectando esta nova parte com o conduto fóssil do chuveiro. Resolvemos descansar em uma sala bastante confortável, próximo da descida para o rio e logo que paramos escutamos as vozes da outra voltando de sua topografia.
Após o almoço, a primeira equipe decidiu iniciar o longo caminho de volta enquanto nós faríamos algumas fotos do grande salão ali ao lado e verificaríamos alguma outra pendência no caminho de volta. E foi na sala do chuveiro que decidimos concluir uma escalada realizada em 2006 por mim e pelo Brandi no final da topografia daquela ocasião. Se tratava de uma íngreme subida próximo à parede direita da sala, se desenvolvendo bem em direção à caverna João Dias. Lembro na ocasião de termos subido e verificado uma continuidade, mas como estávamos cansados acabamos deixando a exploração para outra ocasião.

Desta vez tínhamos mais tempo e energia para continuar e eu havia separado esta pendência caso o conduto de rio não evoluísse. Enquanto a Bia descansava no meio da sala, eu, Rejeito e Diego rumamos por uma inclinada subida seguindo o rastro de 2006. Apesar da inclinação e impressionante desnível até a parte mais baixa da sala, o piso não estava escorregadio e conseguimos rapidamente vencer as partes mais difíceis. Chegamos a condutos horizontais e extremamente ornamentados. Uma ampla sala com mites grandes e várias possibilidades de continuação. Deixamos algumas partes difíceis ou perigosas e seguimos pelos caminhos mais evidentes. Acessamos uma região muito frágil e belíssima. Canudos de 3 a 4m e helictites ornamentavam uma ampla área. Foi o auge do dia em termos de descobertas e explorações. Mapeamos por cerca de duas horas acessando no final mais uma grande sala de onde pudemos nos comunicar com a Bia mais de 50m abaixo, por um terraço. Foi um alívio uma vez que não havíamos levado mochila e nossas baterias principais estavam acabando.Uma vez terminada a topografia tomamos o caminho de volta ao salão do voo livre.

No retorno, verifiquei ainda pelo menos um ponto de acesso à grandes galerias fósseis pelo caminho. Escaladas que exigirão o auxílio de equipagem móvel ou artificial e uma logística exclusiva para esta exploração...

A volta foi lenta e cansativa e por volta das 2h da manhã nos juntamos à primeira equipe na "sala de jantar". Estava muito frio e mesmo com mantas térmicas, isolantes e velas para a criação de "pontos quentes", tivemos dificuldade de dormir ou descansar como prevíamos.

As 5h da manhã desistimos de dormir e iniciamos a difícil tarefa de nos recompor para a saída da caverna. Os últimos 40m verticais foram em meio a uma espécie de lamentação coletiva de cansaço e frio. Mesmo fora da caverna estava difícil de esperar. Enquanto o dia começava a clarear um vento soprava forte de dentro da caverna e uma névoa da manhã permeava as árvores na trilha.

Encontramos o Zè na última subida da trilha, um pouco antes de cruzar o Rio Pilões.
Depois de um banho quente, lá pelas 9h da manhã, desmaiei dentro do saco de dormir para alguns momentos de descanso antes de pegar a estrada de volta a SP.

Foram 20 horas de atividade dentro da caverna e cerca de 400m mapeados de novas galerias. Em breve deveremos ter o mapa contemplando estas partes e datas programadas para continuar a desvendar este gigante quebra-cabeça.

Separação de alguns equipamentos antes da incursão: 100m de cordas (20 para entrada e 80 para trocas), fitas, mosquetões, batedor, kits de topografia, cozinha, etc
Equipe limpinha Sábado de manhã - Agosto 2018
Faltou o Ives que nos encontrou na trilha


Reencontro das duas equipes após primeiro turno de topografias

Reencontro das duas equipes após primeiro turno de topografias

Salão do encontro, último grande salão no extremo Oeste da caverna.

Chegada da equipe no trator, Domingo de manhã. Sujos, com frio, exaustos e felizes.
(Adelino levantou só pra foto)
À direita da imagem as linhas de trena da topografia desta viagem. Detalhe para o salão superior e condutos próximo à superfície. A topografia indica cerca de 30m apenas.


quarta-feira, 23 de maio de 2018

Retomada do trabalho na Caverna Buenos IV


No final de semana dos dias 19 e 20 de Maio de 2018, ao mesmo tempo em que o PETAR (Parque Estadual Turístico do Alto do Ribeira) comemorava seus 60 anos de existência, o GBPE (Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas) realizava mais um trabalho de campo na região de Bulha D'água.
Uma equipe formada por 5 espeleólogos havia programado iniciar explorações e mapeamento na Caverna Velhos Caverneiros, encontrada em meados de Junho de 2017. A descoberta entusiasmou por conta do potencial verificado: Na ocasião, os integrantes caminharam dentro da gruta verificando boas continuidades em um conduto ativo de rio.
O entusiasmo, entretanto, deve considerar a distância e dificuldade de acesso. A caverna encontra-se a cerca de 5 horas de caminhada pelas íngremes e escorregadias encostas de Bulha D'água sem praticamente nenhuma trilha demarcada. O último trecho compreende a uma caminhada de mais de 2 horas dentro do rio Pilões, em um canyon com pouca ou nenhuma área de escape em caso de chuva.
A equipe reuniu-se sexta-feira a noite em Guapiara para os últimos preparativos e pernoite antes de iniciar o caminho mata adentro. Nas mochilas cargueiras encontravam-se equipamentos de caverna,  topografia, acampamento, primeiros socorros, comida e bastante apreensão com o que viria pela frente. 
Havia uma previsão de chuva (aprox 10mm), mas a quantidade de água durante toda a noite surpreendeu obrigando o cancelamento da atividade original no sábado de manhã. Como Plano B, estavam separadas pendências na Caverna Los 3 Amigos ou Buenos IV. Como alguns integrantes não haviam portado equipamento completo de vertical, a equipe decidiu trabalhar na caverna Buenos IV fechando pendências e problemas no mapa desenhado recentemente. A decisão foi acertada, pois além da chuva de sexta-feira, o frio durante a madrugada de sábado e domingo representaria uma forte ameaça à longa caminhada dentro da água para chegar até a Velhos Caverneiros.
A Caverna de Buenos IV tem grandes volumes internos, como salões amplos e um desenvolvimento de difícil representação em planta devido aos diferentes níveis sobrepostos. Por este motivo, o mapa tem dado bastante trabalho e um perfil completo foi desenhado nesta viagem o que ajudará muito na representação gráfica da caverna.

Pouco conhecida mesmo por espeleólogos, a Caverna Buenos IV pode ser considerada de grande relevância ao parque e potencial turístico justamente pelas amplas salas, percurso longo, cenográfico e didático.

Antes do final do dia, algumas imagens foram registradas e a atividade dada como encerrada.

Para se chegar à caverna deve-se caminhar dentro da água em um Canyon no Rio Pilões por cerca de 2h. Foto: Iscoti - blog iscoti.wordpress.com

Entrada da Caverna Velhos Caverneiros, descoberta em 2017 - Foto: Iscoti - blog iscoti.wordpress.com

Zé Guapiara não está mais em sua velha casa, mas a cedeu para nossa pernoite de Sexta-feira antes de entrar no parque.

Foi bem mais agradável enfrentar o frio intenso a beira de um fogão de lenha e pinhões.

Grande sala com entrada superior na Caverna Buenos IV
Além destes grandes volumes superiores fósseis, a caverna ainda dispõe de um nível inferior ativo de rio.



Desenho em Perfil da Caverna Buenos IV. Em breve o mapa contemplará também o perfil de boa parte da caverna.





Travessia da Caverna Ouro Grosso

Texto: Lucas Padoan (Rejeito)
Fotos: Daniel Menin

A visitação da caverna Ouro Grosso, um dos maiores abismos do Brasil, foi organizada pelo XXI Epeleo + Petar 60 Anos e ocorreu na última quarta-feira (16 de maio de 2018). Participaram 13 espeleólogas e espeleólogos, que ao longo de 9 horas e 30 minutos percorreram toda a caverna, iniciando a travessia pela principal dolina de acesso, após cerca de 1 hora de caminhada pela mata morro acima. O percurso foi realizado pela via vertical seca, com acesso ao 2º garrafão, e pela galeria do rio até a ressurgência final da gruta.

A travessia da caverna Ouro Grosso foi organizada pelos espeleólogos Lucas Padoan e Henrique Albuquerque (GGeo), coordenada tecnicamente pelos espeleólogos Diego Ferreira (UPE) e Irineu Ramos (guia local) e documentada através de fotografia pelo espeleólogo Daniel Menin (GBPE). Participou como estagiário na travessia o espeleólogo e guia turístico local Alex Sandro Rodrigues. 

Um dia antes da saída de campo foi realizado no ginásio esportivo do bairro da Serra um teste de proficiência prévio em espeleologia vertical com todos os candidatos à travessia, a fim de priorizar a segurança da atividade e garantir que todas as pessoas envolvidas na travessia teriam domínio das técnicas básicas de progressão em corda. Muitos dos participantes tinham pouca experiência em abismos longos como a caverna Ouro Grosso e, mesmo assim, toda a equipe teve um excelente desempenho durante a travessia da gruta, respeitando todas as instruções de segurança apontadas pela equipe de organização e aplicando os procedimentos corretos de progressão em corda. A travessia também foi muito facilitada pela reequipagem do abismo, executada recentemente pelo 1º Simulado de Espeleoresgate de São Paulo (4 a 6 de maio de 2018). 

Acreditamos que esse bom resultado é fruto da postura da organização em priorizar as boas práticas de segurança, reunir uma equipe de espeleologia experiente e exigir dos participantes da travessia um bom preparo técnico. 

O GGeo agradece a todas e todos os envolvidos na travessia da caverna Ouro Grosso por essa atividade bem sucedida e que, certamente, representa uma experiência muito positiva e marcante! 













segunda-feira, 24 de março de 2008

20-21 de janeiro de 2007 - Gruta de Páscoa e Abismo 31 de Março

por Renata de Andrade

No fim de semana passado (20-21 de janeiro) estive com o Daniel no Petar.
No sábado o destino foi a Gruta da Páscoa, na região da Passoca, cuja topografia do conduto superior foi realizada no final do ano passado (Caê, Toni & cia). Descemos um lance de corda de cerca de 20 metros e demos continuidade à topografia na região inferior. Eu fiquei responsável pela leitura dos equipamentos, anotação e medida das distâncias, munida com a trena a laser, e o Daniel ficou com os croquis e as marcações das bases. A trena a laser facilitou a topografia, mas o ideal seria uma terceira pessoa na anotação e indicação das bases, deixando o croquista apenas com essa função.

O Daniel escalou uma fenda até um conduto superior que aponta uma possível continuação, porém de difícil acesso. Para explorar e mapear este conduto precisaremos de mais uma investida específica de escalada (cadê os escaladores? ).
No domingo, resolvemos comemorar a despedida dos 31 anos do Daniel no Abismo 31 de Março. Estávamos com 130 metros de corda, portanto não descemos muito. A parte do abismo que descemos é muito bonita e o acesso à região inferior (241 metros de desnível) por esse conduto parece ser bem mais fácil que pelo tradicional Juvenal. Paramos em uma região mais estreita e início de uma série de travertinos/ escorrimentos (certamente o caminho da água). A possibilidade de chuva durante nossa investida foi outro fator que nos fez voltar.
É isso, logo mais o Daniel envia o mapa da Páscoa.