"E impelido pela minha ávida vontade, imaginando poder contemplar a grande abundância de formas várias e estranhas criadas pela artificiosa natureza, enredado pelos sombrios rochedos cheguei à entrada de uma grande caverna, diante da qual permaneci tão estupefato quanto ignorante dessas coisas. Com as costas curvadas em arco, a mão cansada e firme sobre o joelho, procurei, com a mão direita, fazer sombra aos olhos comprimidos, curvando-me cá e lá, para ver se conseguia discernir alguma coisa lá dentro, o que me era impedido pela grande escuridão ali reinante. Assim permanecendo, subitamente brotaram em mim duas coisas: medo e desejo; medo da ameaçadora e escura caverna, desejo de poder contemplar lá dentro algo que me fosse miraculoso"

Leonardo Da Vinci
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sábado, 10 de outubro de 2015

Metro a metro, os mapadas das cavernas continuam crescendo em Bulha D'água

(Relato: Thomaz Rocha e Silva - Vagalume e Daniel Menin - fotos: Daniel Menin)

Nos dias 03 e 04 de Outubro foi realizada mais uma viagem para continuidade dos trabalhos em Bulha D'água (PETAR, SP).

Uma equipe composta por 12 espeleólogos (Grupo Bambuí, GEGEO e Meandros) esteve na região, onde os objetivos eram topografar a caverna Louco de Alegre, retopografar a caverna Lago Azul e dar continuidade as explorações na caverna Ribeirãozinho III.

Chegamos no Zé Guapiara depois de uma madrugada de chuva torrencial em Capão Bonito, esperando trilhas enlameadas. Lá o grupo se dividiu em três: Leda, Vagalume, Borboleta e Ivan seguiram com Silvinho, filho caçula do Zé, pra gruta Louco de Alegre. Entramos, atravessamos a sequência de fendas apertadas e chegamos no topo da cachoeira. O Vagalume desceu  o que acreditava ser 5-6m no máximo. Chegou ao fim da corda de 12m a um metro de um platô, do qual a água saltava mais 5 pra baixo e continuava descendo pelo garrafão fazendo bastante barulho, sem contato visual de onde vai. Considerando que a descida toda foi de frente pra parede da gruta, é muito promissor. Na próxima voltaremos realmente equipados, sem subestimar o local.

Outras duas equipes, uma formada por Menin, Bia, Lucas, Alberto e Vic, e outra por Brandi e Fábio, foram pra Ribeirãozinho III dar continuidade às pendências identificadas na viagem anterior.

Menin e a turma do GGEO entraram no desmoronado onde pararam há 15 dias e topografaram condutos apertados em meio aos blocos, sempre subindo rumo ao que acreditamos ser a base de um grande salão superior.
Foi instalada uma corda em um abismo de 11m em meio ao desmoronamento para acessar galerias inferiores. Após a descida, foi possível conectar a topografia da parte superior do desmoronamento com uma base antiga, em um amplo salão já mapeado. A região é instável e um desmoronamento involuntário assustou os espeleólogos enquanto topografavam parte baixa do abismo. Embora o abismo não fosse conhecido, a descida não conectou a parte alta do desmoronamento com novas galerias. Entretanto, foram encontradas continuações superiores próximas ao abismo - ainda não topografada - onde o desmoronamento segue em blocos maiores e com possibilidades de abrir em várias direções. O trabalho nesta área da caverna está cada vez mais difícil, pois para se chegar aos limites não topografados deve-se vencer desmoronamentos longos e labirínticos. Por outro lado, é necessário retornar para topografar e continuar as explorações. A região é promissora pois pode representar o vencimento do desmoronamento que bloqueia a conexão entre esta caverna e o Abismo Los 3 amigos. Encontrar esta conexão certamente seria uma grande descoberta. As dificuldades e distância fizeram com que a equipe  saise da gruta mais tarde, chegando na casa de pesquisa por volta das 22hs.

Com o mesmo intuito de conexão, Brandi e Fábio foram escalar uma passagem um pouco anterior em relação ao desenvolvimento a partir da boca. O perfil da caverna mostra um evidente ramo fóssil que, com abatimentos, é intercalado com o conduto de rio, metros abaixo. A escalada teve ajuda da furadeira e a equipe conseguiu acessar novas galerias. Os trabalhos de topografia não foram concluídos e deverão continuar na próxima viagem.

No domingo, um grupo iniciou a topografia da gruta Lago Azul, que vai continuar em próximas viagens. Foram feitos os condutos principais, com as passagens laterais em aberto.
Outro grupo foi verificar possíveis entradas superiores da Gruta Jerivazal. Foi descoberto, explorado, batizado e mapeada a gruta Jerivazal de Cima, que pode ter conexão com a primeira, ainda a continuar. Um terceiro grupo ficou na casa de pesquisa, fazendo um inventário de melhorias para a instalação.

O final de semana foi muito produtivo. É certo que ainda há muito o que fazer na região. Os mapas das cavernas e os desafios estão aumentando metro a metro a cada viagem.

Equipe completa (Bambuí, GEGEO e Meandros)
Croquis de topografia realizada em longo desmoronamento na caverna Ribeirãozinho III
Croquis de condutos superiores, descobertos através de escalada
Bilhete deixado na base da escalada para informar a outra equipe que a escalada havia dado bons resultados.

Brandi mostrando seus dotes de pilotagem de trator e conquistando um posto importante em Bulha.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Novas possibilidades nas cavernas Ribeirãozinho III e Jerivazal

Bulha D'água - final de semana de 19 e 20 de Setembro de2015
Texto: adaptado de Thomaz (VL) e Brandi
Participaram: Brandi, Fabio, Vagalume, Borboleta, Zé  Guapiara, Menin e seus três Meninin do Grupo Garantia de Espeleo Obcena (GGEO): Tom, Bia e Lucas (Rejeito). 

No ensolarado sábado 19/09 chegamos no Zé, subimos no trator e fomos pro refúgio. De lá partimos pra trilha da Ribeirãozinho III, a qual em condições melhores do que o esperado (porque havíamos aberto a trilha na última viagem!). O calor, mesmo dentro da mata, estava forte, mas no caminho pudemos nos refrescar com água fresca de bambu e na gruta passamos frio, como sempre.

Uma vez na Ribeirãozinho, fomos procurar um dos pontos onde achávamos ter uma boa possibilidade de encontrar alguma galeria superior ao desmoronamento no final da caverna. Procurando o ponto de escalada, acabamos explorando passagens ainda não topografadas. Uma passagem apertada e entre blocos instáveis deu acesso a continuações em várias direções. Um dos caminhos seguia subindo junto à parede da gruta, mas não se desenvolveu por muito, ficando estreito demais. Do outro lado, as possibilidades aumentaram e blocos maiores formaram salões e passagens mais amplas. Resolvemos topografar o caminho do rio até este salão, deixando para explorar melhor as passagens em uma próxima viagem. Foi encontrado neste local um abismo com cerca de 10m livres, 25m acima do nível do rio. Esta galeria entre blocos leva a região oposta da galeria do rio (margem direita) e pode representar uma possibilidade interessante de desenvolvimento da caverna.

Para uma próxima viagem, existem duas boas opções: uma galeria a 30 metros de altura do rio (acessada somente através de escalada) e as continuações em meio ao abatimento (descrita acima).

Na manhã nublada de domingo, fomos topografar a gruta Jerivazal, parcialmente explorada mas sem topo. Enquanto uma equipe seguiu a topografia, os outros integrantes foram bater morro acima nos blocos visíveis. Eram muitas entradas apertadas, todas seguindo para baixo. Uma pequena cavidade sem continuação, e outra com um desnível -86 de uns 6 metros inexplorada. A topo da gruta revelou um salão superior com desmoronamentos e continuação para cima, provavelmente ligando com o desnível superior encontrado. Também ficou pra próxima.

A Jerivazal é uma surpresa, sempre foi desprezada pela sua nada convidativa entrada, entre blocos, teto baixo e rastejando pelo rio gelado... Mas abriram-se algumas possibilidades atrativas. Vale o esforço de insistir uma vez que o rio Jerivazal se conecta a Buenos I a quase 700 metros de distancia pela superfície. A parte ruim e que a gruta corre no contato e por baixo de um canion com diversos abatimentos. Mas gruta é gruta e quem é velho de guerra sabe que a surpresa pode estar escondida atrás de uma tênue sombra ou uma pedra a se deslocar....


Na trilha de volta sol, jararaca e banho de rio nos macacões.










sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Bulha D'água, PETAR, Agosto de 2015

No final de semana de 15 e 16 de Agosto estivemos novamente na região de Bulha D'água, PETAR. O objetivo desta viagem foi a verificação de condutos superiores na caverna Buenos I e também a limpeza da trilha entre a casa de pesquisa e a caverna Ribeirãozinho III.

Munidos de uma furadeira para ajudar aos trabalhos de fixação de cordas, a atividade do Sábado rendeu algumas escaladas em condutos superiores sem grandes desenvolvimentos e a descida de dois abismos, que também se fecharam após alguns metros. A facilidade e a rapidez do trabalho com a furadeira elétrica abre novas possibilidades as explorações verticais. Tanto em escalada artificial para acessar áreas antes de muito difícil acesso quanto para a descida em pouco tempo de lances verticais que antes dariam muito mais trabalho.

O conduto verificado foi mapeado na ocasião de sua descoberta e ficou conhecido por uma passagem suspensa que originou o apelido de nosso amigo - que por sinal foi um dos organizadores da viagem e não compareceu - Vaga-lume.

Além da passagem suspensa, o conduto apresenta outra curiosidade: diversos fósseis de cobras encontram-se pelo caminho. Certamente caídas de alguma entrada superior ou então levadas pela água em algum período de enchente.

No Domingo o dia foi dedicado à limpeza da trilha entre a casa de pesquisa e a Caverna Ribeirãozinho III. Com a exuberante mata da região e a ausência de espeleólogos, em pouco tempo a trilha já encontrava-se em processo de fechamento pela mata, o que reforça a necessidade de manutenção em caminhos e estradas da região para que as grutas ainda não estudadas completamente não se percam novamente.


Uma próxima viagem está programada para ainda este ano onde uma equipe deverá investir em uma escalada artificial no final da caverna Ribeirãozinho III. O objetivo é sistematicamente buscar conexões com o abismo através de seu sumidouro e ressurgência antes de novas investidas pela entrada vertical.

(Fotos Daniel Menin e Luciana Fakhouri)



















terça-feira, 30 de abril de 2013

Ribeirãozinho III: explorando os condutos superiores


Não por acaso, a empolgação era grande. Há quase cinco meses havíamos descoberto uma promissora continuação da caverna Rireibãozinho III e desde então não pudermos retornar à caverna por conta das chuvas (veja postagens anteriores sobre Ribeirãozinho III). Desta vez, tudo ocorreu como planejado. O tempo estava ótimo e Sábado, dia 27 de Abril de 2013 ao meio-dia, estávamos na boca da caverna para o início da aventura.
Participaram da viagem 5 espeleólogos. Uma equipe formada por Roberto Brandi e Fábio Von Tein e eu (Daniel Menin), com a atribuição de explorar os condutos superiores. Uma segunda equipe foi formada por Iscoti, Claudete e Zé para atividades de coleta de bio, em outra caverna.

Entrando na gruta seguimos direto pela galeria do rio até a “prainha”, ponto onde deixamos a corda amarrada em um grande bloco, longe da água. Chequei antes dos companheiros e fui procurar na beira do rio meu blocante de pé (Pantin), que havia esquecido na última viagem. Quem sabe, por sorte ele não teria sido levado pela força da água nas enchentes de verão? Quando já estava prestes a desistir percebi algo refletindo a luz da lanterna metros abaixo, no fundo do rio. Ao me aproximar pude distinguir o Pantin preso nas pedras debaixo d'água. Estava surpreendentemente intacto apesar dos meses submerso!
A equipe era pequena e experiente e subir na corda transpondo os fracionamentos foi uma tarefa rápida. O Brandi e o Fábio subiram na frente e eu fui fechando o caminho, recolhendo a corda para descermos por outra alternativa mais fácil.

Minutos depois e estávamos todos reunidos no platô final da escalada. Ali encontrei minha bolsa com equipamentos de ancoragem, também deixada na viagem anterior. Agora não faltava mais nada e estávamos diante do momento mais aguardado da viagem: explorar as continuações da caverna e desvendar o mistério de encontrar uma conexão com a grande caverna Los 3 Amigos!

Antes de seguir pelo caminho mais óbvio, explorado parcialmente na viagem anterior, decidimos tentar outra alternativa: uma possibilidade entre blocos na lateral da parede do platô parecia nos levar a um salão ainda maior. Entramos em uma escalada fácil, mas apertada, tentando seguir um caminho mais próximo à encosta, com cuidado para não nos expormos ao vazio vertical do conduto do rio a dezenas de metros abaixo. Mais um pouco de aperto e chegamos a uma área ampla, onde pude ficar de pé e ver um vasto salão acima. Mais uma escalada entre blocos desmoronados e chegamos à grande sala.  Apesar do volume, as chances da caverna continuar por ali não eram das melhores. Devido a instabilidade do local não foi possível forçar passagem ou entrar nas fendas que poderiam nos levar a algum lugar. Rochas soltas e afiadas e teto com blocos cuidadosamente acomodados faziam do local um ambiente extremamente perigoso. Uma área com desmoronamentos recentes e constantes. Descendo uma fenda lateral, para acessar um salão menor e uma possível passagem desloquei uma grande pedra quase sendo carregado junto. Esgotadas as possibilidades claras de continuações, decidimos topografar o salão e retornar ao platô da escalada.

Enfim de retorno ao ponto inicial resolvemos seguir topografando pela continuação mais evidente da caverna. Após uma passagem estreita entre formações, por onde sopra um promissor vento, acessamos uma vasta sala. Talvez uma das áreas mais bonitas da caverna: um belíssimo altar, formado por uma sequência de travertinos e escorrimentos de calcita, ornamentado com duas colunas e uma série de cortinas. À direita, uma área com escorrimentos e estalagmites e estalactites sugeriria uma boa continuação da caverna em um conduto 30 graus inclinados para cima. À esquerda uma sucessão de cascatas de calcita brilhante formando um "chão de estrelas" sucedido por um vasto salão desmoronado. Agora sim a brincadeira estava ficando boa!

Decidimos mais uma vez deixar o melhor para depois e seguimos primeiro à esquerda, topografando o salão e em seu final uma instável subida de blocos. Após a subida, chegamos até uma área novamente apertada e instável. Esgotadas as possibilidades de continuação, resolvemos voltar e seguir pelo caminho mais promissor.

Retornamos ao altar e topografamos a subida à direita. Apesar do entusiasmo, a topografia não atendeu às expectativas e o conduto acabou entre blocos abatidos alguns metros acima. Agora havíamos encerrado todas as possibilidades claras de continuação. O vento, ora presente na passagem apertada, agora não era mais percebido  diminuindo ainda mais o entusiasmo. O cansaço também estava apertando e por volta das 19hs resolvemos dar por encerrada a topografia e estudar o melhor caminho para a voltarmos com segurança. Não seria desta vez que encontraríamos uma nova entrada para Los 3 Amigos.

Conforme planejado equipamos uma outra via de descida, agora recolhendo a corda na medida em que íamos descendo. Unimos a topografia do platô superior com o conduto do rio e iniciamos o penoso retorno à casa de pesquisa. A partir deste momento iniciou-se a sequência de alívios típica da região de Bulha D´água. Alívio por sair da caverna, alívio por cada subida vencida na trilha. Alívio por chegar na casa de pesquisa. Alívio por tomar banho, mesmo que gelado. Alívio por comer um baita macarrão cozinhado pela Claudete e, enfim alívio por entrar no saco de dormir e cair em um profundo e merecido sono de descanso. Encerra-se aqui mais um ciclo. Uma atividade de escalada subterrânea e exploração de novas galerias que levou quase um ano, 3 viagens e muito esforço. Que embora não tenha cumprido a expectativa de conectar a caverna Ribeirãozinho III com o Abismo Los 3 Amigos nos rendeu boas histórias, grandes aventuras e  muito divertimento. E assim os anos vão se passando e nós espeleólogos apaixonados pelo desafio e por aventura vamos somando experiência e construindo pouco a pouco um complexo e infinito quebra-cabeça subterrâneo.

Equipe feliz da vida antes da encrenca

Fábio praticando seu esporte predileto: caçamba-surf


Os últimos corajosos, partindo pra trilha
Fabio Von Tein na corda e Brandi no segundo patamar



Brandi à esquerda, no platô (final da escalada) e Fábio no meio do caminho


Artística
Passagem estreita e inclinada, mas que dá acesso as novas galerias


Área nova, cascatas de calcita brilhante ("chão-de-estrelas")



Área nova, subida à esquerda e calcitas à direita



Brandi equipando descida para recuperação de corda


Brandi iniciando descida


Brandi morrendo de medo!


Domingo de recuperação