Textos e fotos:
Daniel Menin e Fabio Von Tein
No último final de semana, 1 e 2 de Dezembro, estivemos novamente em Bulha D'Água, PETAR, SP para dar andamento aos trabalhos sistemáticos de exploração e mapeamento das cavernas da região.
Na Sexta-feira, como já é de costume, dormimos na casa do Zé Guapiara, último trecho possível de estrada de terra a se fazer com carro comum. A viagem foi mais cansativa do que de costume devido às fortes chuvas que parece terem insistido em seguir por cima de nosso carro desde a saída de São Paulo.
Não posso dizer que consegui efetivamente dormir de Sexta para Sábado. Além da ansiedade para o dia seguinte, não foi o barulho dos trovões, mas uma sinfonia em último volume de roncos que atrapalhou. O sono veio mesmo naquele cochilo de manhã cedinho, pouco antes de levantar.
Malas arrumadas e subimos no trator. Aquela felicidade com a trilha menor da última viagem logo foi literalmente por água abaixo quando soubemos que a estrada aberta não poderia ser feita nem por trator desta vez, o que nos obrigou a ir até a casa de pesquisa e percorrer o tradicional caminho de quase 2h no sobe e desce de trilhas até a caverna.
Desta vez, foram organizadas duas equipes sendo a primeira para descer o Abismo Los Três Amigos e a segunda para prospecção externa em busca de novas entradas.
Abaixo seguem os relatos de cada equipe, bem como imagens e resultados da viagem:
Equipe 1: fundo
O objetivo nesta viagem era de retomar a exploração e topografia no setor Leste da caverna, à jusante do rio. Há quase dez anos, apenas uma equipe esteve daquele lado, quando Ezio, Lilia e Cesar mapearam um enorme conduto fóssil até um trecho vertical de onde ouvia-se o barulho do rio metros abaixo, mas sem a possibilidade de descer devido a um lance vertical de aproximadamente 17m (indicado no croquis). A equipe também deixou algumas laterais em aberto no conduto principal o que deveria ser revisto nesta viagem.
Entramos na caverna as 12h do Sábado, nos separando da equipe externa. Em apenas 3 espeleólogos (Daniel, Ives e Eduardo), descemos rápido até o salão do vôo-livre, onde fizemos um rápido lanche. Obviamente nos perdemos um pouco para encontrar o caminho que desce do salão para acessar o grande conduto à Leste. Acontece que os desníveis e blocos enormes dificultam muito o caminhamento naquele ponto da caverna existindo poucos acessos para qualquer lado que seja.
Seguimos pelo conduto ora descendo para o rio, ora por cima de blocos até encontrarmos uma passagem bastante exposta ao lado de um escorrimento. Pude então observar um corrimão instalado há dez anos pelo Ezio. Corda, mosquetão, nó... tudo estava calcificado incorporando-se à formação. Incrível a velocidade de calcificação nestas condições de escorrimento ativo. Conseguimos transpor o corrimão sem grandes problemas e nos deparamos com a supercortina, formação conhecida por mim apenas por um croquis há dez anos. Realmente trata-se de uma formação impressionante, sem dúvida a maior cortina que eu já vi em minha vida, com mais de 2 metros de largura, cerca de 50cm de diâmetro e 30 de altura. Prometi que faria uma fotografia na volta.
Seguimos por um conduto de rio com bastante água e corredeiras. Em alguns lugares imaginei a força da água em um caso de enchente, mas ao mesmo tempo o conduto oferecia muitos pontos de fuga.
Chegamos a um desmoronamento cujo caminho por baixo parecia impossível. Apenas uma escalada muito exposta e em negativo nos levaria até uma visível grande área superior. Tentamos entre os blocos e já estávamos quase desistindo quando conseguimos passar por um estreito local e acessar a parte alta do conduto. Mais alguns metros e constatamos ter chegado ao final da área mapeada. De cima de um terraço podíamos ouvir o rio lá embaixo e a continuação do conduto, mas não podíamos vê-lo. Tentei descer entre blocos e cheguei a uma lada com boas condições de iniciar um rappel. Como levamos conosco 20m de corda, fiz uma ancoragem natural em 2 estalagmites bem confiáveis e iniciei a descida. Cheguei até uma borda não muito segura. Daí em diante eu ficaria totalmente pendurado e portanto deveria dispor de proteção de corda ou instalar um fracionamento. Sem chances de novas ancoragens naturais ou de bater um spit (não levamos batedor), deixei a descida para outro dia. Pelo que puder ver da borda do terraço, a corda seria insuficiente para descer o que me desanimou de forçar e me pendurar.
Subimos recolhendo toda a corda e a deixei enrolada em um lugar bem visível para a próxima viagem.
Fiz um croquis para completar o mapa e iniciamos nossa volta.
Durante o caminho da volta, mapeamos um longo trecho de rio deixado em aberto na primeira topografia. Tratava-se nada menos do que um conduto com cerca de 8m de diâmetro e mais de 30 de altura. Realmente, as proporções na caverna Los Três Amigos deixam qualquer outra gruta inexplorada para trás...
Chegamos na base do vôo-livre as 23h da noite. O último espeleólogo (no caso, eu) chegiu no patamar da soneca, a -40m da entrada a 1h da manhã encontrando os demais já esquentando água para um delicioso Cup Noodles...
Também fiz meu jantar, tirei o macacão molhado e os equipamentos e tratei de preparar um ponto quente para descansar. Enrolado em uma manta térmica e me espremendo em um pequeno pedaço de isolante térmico dormi profundamente por umas 3h e depois alternei entre descanso e chá quente até as 5h40 quando resolvemos seguir caminho.
As 8h30 da manhã de Domingo chegávamos cansados na casa de pesquisa sendo recebidos pela equipe externa com a notícia de terem encontrado uma possível nova entrada.
Equipe 2: prospecção externa
Iniciamos uma trilha contornando o abismo dos ossos pelo lado norte. Logo no início encontramos uma bela jararaca de 1,5m a poucos centímetros de nosso caminho, que se assustou e sumiu mato adentro. Seguimos o caminho recém-aberto e em seguida viramos a sul, seguindo o que seria o mapa da gruta muitos metros abaixo.
O caminho segue por uma sequência de grandes dolinas, indicando que a gruta possui uma enorme quantidade de galerias fósseis a poucos metros da superfície. Entretanto não achamos nenhuma passagem.
Neste rumo chegamos à beira do que seria o topo do vale do sumidouro da gruta Ribeirãozinho, uma região repleta de grandes blocos calcários.
Zé Guapiara havia comentado que já conhecia o lado oeste, indo de encontro a gruta João Dias, e decidimos, portanto, seguir a leste, onde avistávamos grandes paredões calcários brancos.
A descida foi árdua, sempre entre muitos blocos, mas eventualmente chegamos na base do paredão branco, que se mostrou um grande abrigo de rocha desmoronado e com forte declive. A lateral esquerda segue por diversos metros, formando salões. Uma nova caverna, mas sem, entretanto, apresentar seguimento. Já o lado direito também apresenta continuidade, mas aqui podemos sentir uma clara corrente de ar. Foi identificada uma passagem estreita, ligeiramente obstruída, que pode oferecer seguimento se melhor explorado. Acreditamos que pode haver aqui uma passagem aos salões superiores da gruta L3A, no extremo oeste da mesma.
Ao sairmos, continuamos a descer o vale, seguindo o som do rio muitos metros abaixo, no sentido do sumidouro e pouco mais abaixo achamos outra boca com vento, mais estreita, mas claramente com forte corrente de ar. Este é mais um lugar que precisa ser melhor explorado.
Continuamos a descida e eventualmente chegamos ao rio, iniciando a árdua subida pela antiga trilha, chegando de volta ao abrigo depois de duas horas de caminhada.
A região promete. Novas possibilidades de acesso ao L3A precisam ser detalhadamente exploradas, e quem sabe, oferecer um acesso mais fácil à maior e mais fantástica caverna da região.
Equipagem da entrada da caverna, Sábado de manhã |
Equipagem da entrada da caverna, Sábado de manhã |
Grandes condutos na jusante da caverna. Os desníveis e grandes blocos dificultam o caminhamento na caverna. |
Conduto de rio mapeado na viagem |
Conduto de rio mapeado na viagem |
Enquanto isso a equipe 2 bebe água fresca na sombra de um paredão. Será que encontraram uma nova entrada? Tem vento! |
Super cortina (iluminando para trás) |
Super cortina (iluminando para frente) |
Nosso estado, saindo da caverna. |
Ao chegar na casa de pesquisa, após mais 2h de trilha. |
Partes do croquis da viagem. Ponto final da topografia com abismo e continuação. |
Mapa atual com condutos e correções realizadas na viagem. |
Conduto inferior de rio topografado na viagem |
Conduto superior que não estava indicado (possível acessar através de escalada artificial) e croquis da continuação da caverna. |
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